quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

SEMINÁRIO - A IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE [ aula referente aos dias 10 e 17 de outubro de 2013]


Stuart Hall                        

Nesses dias a turma foi dividida para que pudéssemos dialogar sobre a obra de Stuart Hall - A identidade na pós-modernidade. Esse livro foi o desfecho do tema abordado na 7º primavera dos museus... Abaixo um breve resumo de cada capítulo para maior entendimento...

1 A IDENTIDADE EM QUESTÃO
... velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. A assim chamada "crise de identidade" é vista como parte de um processo mais amplo de mudança , que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social. (pag7)

... as identidades modernas estão sendo "descentradas", isto é, deslocadas ou fragmentadas. (pag8)

Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. (pag9)

... a afirmação de  que é descrito, algumas vezes, como nosso mundo pós-moderno, nós somos também "pós" relativamente a qualquer concepção essencialista ou fixa de identidade - algo que, desde o Iluminismo, se supõe definir o próprio núcleo ou  essência de nosso ser  e fundamentar nossa existência como sujeitos humanos. (pag10)

Três concepções de identidade
1. o sujeito Iluminismo, estava baseado numa concepção da pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência  e de ação, cujo "centro" consitia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencialmente o mesmo, ao longo da existência do indivíduo. (pag11)

2. o sujeito sociológico, refletia  a crescente complexidade do mundo e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e auto-suficiente, mas era formado na relação com "outras pessoas importantes para ele", que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e símbolos dos mundos que ele/ela habitava. (pag11)

3. o sujeito pós-moderno,  conceptualizado  como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma "celebração móvel":formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall,1987). É definida historicamente, e não biologicamente. (pag12/13)

 O caráter da mudança na modernidade tardia
... em particular, ao processo de mudança conhecido como "globalização" e seu impacto sobre a identidade cultural. (pag14)

As sociedades da modernidade tardia, argumenta ele (Laclau), são caracterizadas pela "diferença"; elas são atravessadas por diferentes divisões e antagonismo sociais que produzem uma variedade de diferentes "posições se sujeito" - isto é, identidades - para os indivíduos. (pag17)

2 NASCIMENTO E MORTE DO SUJEITO MODERNO
O nascimento do "indivíduo soberano", entre o Humanismo Renascentista do século XVI e o Iluminismo do século XVIII representou uma ruptura importante com o passado. Alguns argumentam que ele foi o motor que colocou todo o sistema social da "modernidade" em movimento. (pag25)

... o fato de que o sujeito moderno "nasceu" no meio da duvida e do ceticismo metafisico nos faz lembrar que ele nunca foi estabelecido e unificado como essa forma de descreve-lo parece sugerir.(pag26/27)

Vários teóricos como Descartes e John Locke, contribuirão para o tema.

Ainda era possível, no seculo XVIII, imaginar os grandes processos da vida moderna como estando centrados no individuo "sujeito-da-razão". Mas a medida em que as sociedades modernas se tornavam mais complexas, elas adquiriam uma forma mais coletiva e social.(pag29)

O individuo passou a ser visto como mais localizado e "definido" no interior dessas grandes estruturas e formações sustentadoras da sociedade moderna. Dois importantes eventos contribuíram para articular um conjunto mais amplo de fundamentos conceptuais para o sujeito moderno. O primeiro foi a biologia darwiniana. O sujeito humano foi "biologizado" - a razão tinha uma base na Natureza e a mente um "fundamento" no desenvolvimento físico do cérebro humano. O segundo evento foi o surgimento das novas ciências sociais.(pag30)

Este modelo sociológico interativo, com sua reciprocidade estável entre "interior" e "exterior", e, em grande parte, um produto da primeira metade do seculo XX, quando as ciências sociais assumem sua forma disciplinar atual. Entretanto, exatamente no mesmo período, um quadro mais perturbado e perturbador do sujeito e da identidade estava começando a emergir dos movimentos estéticos e intelectuais associado com o surgimento do Modernismo. Encontramos, aqui, a figura do individuo isolado, exilado ou alienado, colocado contra o pano-de-fundo da multidão ou da metrópole anonima e impessoal.(pag32)

  Descentrando o sujeito
A primeira descentração importante refere-se as tradições do pensamento marxista.(pag34)

Eles argumentavam que o marxismo, corretamente entendido, deslocara qualquer noção de agencia individual. Marx deslocou duas proposições-chave da filosofia moderna:
     - que ha uma essência universal de homem;
     - que essa essência e o atributo de "cada individuo singular", o qual e seu sujeito real.(pag35)

Essa "revolução teórica total" foi, e obvio, fortemente contestada por muitos teóricos humanistas que dão maior peso, na explicação histórica, a agencia humana.(pag36)

Assim, em vez de falar da identidade como uma coisa acabada, deveríamos falar de identificação, e vê-la como um processo em andamento.(pag39)

O terceiro descentramento que examinarei esta associado com o trabalho do linguista estrutural, Ferdinand de Saussure. Saussure argumentava que nos não somos, em nenhum sentido, os "autores" das afirmações que fazemos ou dos significados que expressamos na língua.(pag40)

O quarto descentramento principal da identidade e do sujeito ocorre no trabalho do filosofo e historiados francês Michel Foucault. Numa serie de estudos, Foucault produziu uma especie de "genealogia do sujeito moderno". Foucault destaca um novo tipo de poder, que ele chama de "poder disciplinar". O poder disciplinar esta preocupado, em primeiro lugar, com a regulação, a vigilância e o governo da especia humana ou de populações inteiras e, em segundo lugar, do individuo e do corpo.(pag41/42)

O quinto descentramento que os proponentes dessa posição citam e o impacto do feminismo, tanto como uma critica teórica quanto como um movimento social.(pag43/44)

3 AS CULTURAS NACIONAIS COMO COMUNIDADES IMAGINADAS
No mundo moderno, as culturas nacionais em que nascemos se constituem em uma das principais fontes de identidade cultural.(pag47)

Segue-se que a nação não e apenas uma entidade politica mas algo que produz sentidos - um sistema de representação cultural. A formação de uma cultura nacional contribuiu para criar padrões de alfabetização universais, generalizou uma unica língua vernacular como o meio dominante de comunicação em toda a nação, criou uma cultura homogênea e manteve instituições culturais nacionais, como, por exemplo, um sistema educacional nacional. Dessa e de outras formas, a cultura nacional se tornou uma característica-chave da industrialização e um dispositivo da modernidade.(pag49/50)

 Narrando a nação: uma comunidade imaginada
As culturas nacionais são compostas não apenas de instituições culturais, mas também de símbolos e representações.(pag50)

As culturas nacionais, ao produzir sentidos sobre "a nação", sentidos com os quais podemos nos identificar, constroem identidades. Anderson argumenta que as diferenças entre as nações residem nas formas diferentes pelas quais elas são imaginadas. Como e contada a narrativa da cultura nacional?
     - Em primeira lugar, ha a narrativa da nação, tal como e contada e recontada nas historias e nas literaturas nacionais, na mídia e na cultura popular.
     - Em segundo lugar, ha a enfase nas origens, na continuidade, na tradição e na intemporalidade.
     - Uma terceira estrategia discursiva e constituída por aquilo que Hobbsbawm e Ranger chamam de invenção da tradição.
     - Um quarto exemplo de narrativa da cultura nacional e a do mito fundacional: uma estoria que localiza a origem da nação, do povo e de seu caráter nacional num passado tao distante que eles se perdem nas brumas do tempo, não do tempo "real", mas de um tempo "mítico".
     - A identidade nacional e também muitas vezes simbolicamente baseada na ideia de um povo ou folk puro, original. Mas, nas realidades do desenvolvimento nacional, e raramente esse povo(folk) primordial que persiste ou que exercita o poder. (pag51/52/53/54/55/56)

O discurso da cultura nacional não e, assim, tao moderno como aparenta ser. Ele constrói identidades que são colocadas, de modo ambíguo, entre o passado e o futuro.(pag56)

4 GLOBALIZAÇÃO
...a "globalização" se refere àqueles processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo, tornando o mundo, em realidade e experiência, mais interconectado.(pag67)

Essas novas características temporais e espaciais, que resultam na compressão de distâncias e de escalas temporais, estão entre os aspectos mais importantes da globalização a ter efeito sobre as identidades culturais.(pag68)

Lembremos que a globalização não é um fenômeno recente: "A modernidade é inerentemente globalizante". (pag68)

Assim, tanto a tendência à autonomia nacional quanto a tendência à globalização estão profundamente enraizadas na modernidade. (pag68)

Nesta e na próxima seção, tentarei descrever as consequências desses aspectos da globalização sobre as identidades culturais, examinando três possíveis consequências:
- As identidades nacionais estão se desintegrando, como resultado do crescimento da homogeneização cultural e do pós-moderno global.
- As identidades nacionais e outras identidades locais ou particularistas estão sendo reforçadas pela resistência à globalização.
- As identidades nacionais estão em declínio, mas novas identidades – híbridas – estão tomando seu lugar. (pag69)

Compressão espaço-tempo e identidade
Que impacto tem a última fase da globalização sobre as identidades nacionais? Uma de suas características principais é a compressão espaço-tempo, a aceleração dos processos globais, de forma que se sente que o mundo é menor e as distâncias mais curtas, que os eventos em um determinado lugar têm um impacto imediato sobre pessoas e lugares situados a uma grande distância.(pag69)

... o tempo e o espaço são também coordenadas básicas de todos os sistemas de representação. Todo meio de representação – escrita, pintura, desenho, fotografia, simbolização através da arte ou dos sistemas de telecomunicação – deve traduzir seu objeto em dimensões espaciais e temporais. Assim, a narrativa traduz os eventos numa sequência temporal começo-meio-fim; os sistemas visuais de representação traduzem objetos tridimensionais em duas dimensões. Diferentes épocas culturais têm diferentes formas de combinar essas coordenadas espaço-tempo.(pag71)

... a identidade está profundamente envolvida no processo de representação. Assim, a moldagem e a remoldagem de relações espaço-tempo no interior de diferentes sistemas de representação têm efeitos profundos sobre a forma como as identidades são localizadas e representadas.(pag71)

Todas as identidades estão localizadas no espaço e no tempo simbólicos.(pag71)

O lugar é específicos, concreto, conhecido, familiar, delimitado: o ponto de práticas sociais específicas que nos moldaram e nos formaram e com quais nossas identidades estão estreitamente ligadas:
               
 Nas sociedades pré-modernas, o espaço e o lugar eram amplamente coincidentes, uma vez que as dimensões espaciais da vida social eram, para a maioria da população, dominadas pela presença – por uma atividade localizada. A modernidade separa cada vez mais o espaço do lugar, ao reforçar relações entre outros que estão ausentes, distantes (em termos de local), de qualquer interação face-a-face. Nas condições da modernidade, os locais são inteiramente penetrados e moldados por influências sociais bastante distantes deles. O que estrutura o local não é simplesmente aquilo que está presente na cena; a forma visível do local oculta as relações distanciadas que determinam sua natureza.(Giddens,1990,p.18). (pag72)


Os lugares permanecem fixos; é neles que temos raízes. Entretanto, o espaço pode ser cruzado num piscar de olhos – por avião a jato, por fax ou satélite. Harvey chama isso de destruição do espaço através do tempo. (pag72/73)

Em direção ao  pós-moderno global?
Alguns teóricos argumentam que existem evidências de um afrouxamento de fortes identificações com a cultura nacional, e um reforçamento de outros laços e lealdades culturais, acima e abaixo do nível do estado-nação. As identidades nacionais permanecem fortes, especialmente com respeito a coisas como direitos legais e de cidadania, mas as identidades locais, regionais e comunitárias têm se tornado mais importantes. Colocadas acima do nível da cultura nacional, as identificações globais começam a deslocar e, algumas vezes, a apagar as identidades nacionais.(pag73)

Alguns teóricos culturais argumentam que a tendência em direção a uma maior independência global está levando ao colapso de todas as identidades culturais fortes e está produzindo aquela fragmentação de códigos culturais...(pag73)

Os fluxos culturais entre as nações, e o consumismo global criam possibilidades de “identidades partilhadas”, como consumidores para os mesmos bens, clientes para os mesmos serviços, públicos para as mesmas mensagens e imagens – entre pessoas que estão bastante distantes umas das outras no espaço e no tempo.(pag74)

As identidades nacionais, como vimos, representam vínculos a lugares, eventos, símbolos, histórias particulares. Elas representam o que algumas vezes é chamado de uma forma particularista de vínculo ou pertencimento. Sempre houve uma tensão entre essas identificações e identificações mais universalistas – por exemplo, uma identificação maior com a humanidade do que com a inglesidade.(pag76)

O global, o local e o retorno da etnia
A homogeneização cultural é o grito angustiado daqueles que estão convencidos de que a globalização ameaça solapar as identidades e a unidade das culturas nacionais.(pag77)


Pode-se considerar, no mínimo, três qualificações ou contra tendências principais, A primeira vem do argumento de Kevin Robin e da observação de que, ao lado da tendência em direção à homogeneização global, há também uma fascinação com a diferença e com a mercantilização da etnia e da "alteridade".(pag77)

A segunda qualificação é que a globalização é muito desigualmente distribuída ao redor do globo, entre regiões e entre diferentes estratos da população dentro das regiões.(pag78)

O terceiro ponto na crítica da homogeneização cultural é a questão de se saber o que é mais afetado por ela.(pag78)

Na última forma de globalização, são ainda as imagens, os artefatos e as identidades da modernidade ocidental, produzidos pelas indústrias culturais das sociedades ocidentais(incluindo o Japão) que dominam as redes globais. (pag79)

REFERENCIAS
Hall, Stuart; Silva, Tomaz Tadeu da; Louro, Guacira Lopes.  A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.




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